Crítica | Peça ELAS enxerga com poesia fim do amor entre duas jovens mulheres

Fernanda Heitzmann e Carol Moreno estão em cena na peça ELAS - Foto: Sol Faganello/Divulgação - Blog do Arcanjo 2021
Fernanda Heitzmann e Carol Moreno estão em cena na ótima peça ELAS do Coletivo Caracóis – Foto: Sol Faganello/Divulgação – Blog do Arcanjo 2021

Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo

O ano de 2020 não foi fácil para os casais. O de 2021, tampouco. Afinal, as tensões de um relacionamento amoroso tendem a aumentar consideravelmente diante do confinamento. Seja conjunto ou à distância, o que pode ser um novo agravante para possíveis rusgas ou até mesmo rupturas definitivas.

Será que neste momento um casal tem cabeça para tomar decisões tão profundas como uma separação definitiva? Como dar tal passo se o horror está à espreita do lado de fora das portas trancadas?

Estas bem que poderiam ser perguntas pertinentes às personagens do ótimo espetáculo ELAS, do Coletivo Caracóis, que abriu a Mostra Aldir Blanc na SP Escola de Teatro após bem sucedida temporada na SP Escola de Teatro Digital.

Burburinho na Satyrianas

Aliás, o espetáculo gerou burburinho desde sua apresentação no Festival Satyrianas, em dezembro de 2020, com fartos elogios daqueles que presenciaram a primeira sessão do então experimento cênico virtual, bem como a própria equipe técnica que cuidou da transmissão — cujo elogio é sempre mais valioso.

Foi o jornalista Rodrigo Barros, que assistiu à montagem neste então, quem me avisou de sua importância e destaque entre a avalanche de montagens digitais, com boas atuações, argumento tocante e, sobretudo, uma discussão do contemporâneo sem abrir mão de uma boa história.

E ele não mentiu. Foi exatamente isso que presenciei ao assistir a ELAS, sim, com caixa alta mesmo, da tela do meu notebook.

Atrizes em sintonia

Em cena, as atrizes Carol Moreno e Fernanda Heitzmann estão sintonizadas como um casal que vê seu amor ruir aos poucos, na banalidade do conflito cotidiano reforçado pelo absurdo do mundo ao redor.

Algumas questões típicas de casais LGBTQIA+, que vivenciam diariamente o preconceito social, também servem para minar a relação, como a resistência de uma delas ao beijo público.

O impedimento dos sentidos aguçados por conta do distanciamento funciona como uma pólvora espalhada sobre terreno minado. É perceptível que a explosão pode vir a qualquer momento. Como não poderia deixar de ser, a relação dELAs é afetada pelo seu contexto histórico surreal (o nosso atualmente no Brasil), por mais que este crítico, que adora finais felizes, torça pelo contrário.

Merecem aplausos efusivos Carina Murias, Carol Moreno, Fernanda Heitzmann, Maria Carolina Ito, Náshara Silveira e Sol Faganello (também responsável por arte gráfica, fotografia e vídeo). Foram elas quem criaram o espetáculo formando o Coletivo Caracóis — o nome é adorável, não? —, o que prova que quando um time tem vontade de fazer, as coisas acontecem mesmo diante das mais absurdas adversidades.

Punk rock feminista

A direção de Náshara Silveira e Sol Faganello é sensível e cria estados interessantes entre as personagens, bem como não deixa de dialogar com as possibilidades estéticas do teatro digital, em vez de ignorá-las como certa parte do teatro pré-2020 ainda vem fazendo de forma teimosa e obtusa, afinal, o novo já se impôs, queira-se ou não.

Carina Murias condensa o texto escrito pelas atrizes em uma dramaturgia repleta da poesia da dor do fim, que encontra acolhida na iluminação propositiva e na ambientação sonora apropriada de Maria Carolina Ito — a aparição final da icônica banda oitentosa As Mercenárias é a cereja do bolo. Até porque, se é para se acabar uma relação de amor jovem e lésbica, que seja com punk rock feminista da melhor qualidade.

Peça de teatro digital
ELAS, do Coletivo Caracóis
✪✪✪ Muito Bom
Crítica por Miguel Arcanjo Prado


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Jornalista cultural influente e respeitado no Brasil, Miguel Arcanjo Prado é CEO do Blog do Arcanjo, fundado em 2012, e do Prêmio Arcanjo, desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Coordena a Extensão Cultural da SP Escola de Teatro e apresenta o Arcanjo Pod. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por Globo, Record, R7, Record News, Folha, Abril, Huffpost Brasil, Notícias da TV, Contigo, Superinteressante, Band, CBN, Gazeta, UOL, UMA, OFuxico, Rede TV!, Rede Brasil, Versatille, TV UFMG e O Pasquim 21. Integra o júri de Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de São Paulo, Prêmio Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Prêmio Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil de Curtas. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação Nacional ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade do Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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