Morte de Antunes Filho é fim de uma era no teatro brasileiro

Antunes Filho (1929-2019) – Foto: Bob Sousa – Blog do @miguel.arcanjo – UOL

A morte do diretor teatral Antunes Filho aos 89 anos nesta quinta (2) deixa o teatro brasileiro em luto e marca o fim de uma era nos palcos.

Seu corpo é velado nesta sexta entre 8h e 15h no Teatro Anchieta do Sesc Consolação (r. Dr. Vila Nova, 245, Vila Buarque), que está aberto ao público, em São Paulo. Depois, segue para cerimônia de cremação restrita aos familiares e amigos íntimos na Vila Alpina.

Antunes foi um dos nomes mais importantes de nosso teatro moderno, forjado junto aos grandes diretores do antigo TBC, o Teatro Brasileiro de Comédia, em São Paulo.

E, durante toda sua extensa e produtiva vida, seja como diretor de peças ou durante seu trabalho no CPT (Centro de Pesquisa Teatral) do Sesc São Paulo, foi um ferrenho representante de um estilo rigoroso e obsessivo de se fazer artes cênicas.

Respeitado e também bastante temido por seus pupilos — tinha predileção por trabalhar com atores jovens —, Antunes era visto como diretor dos mais exigentes por seus artistas e pela classe teatral como um todo.

Velório de Antunes Filho emociona artistas do teatro

Morre Antunes Filho aos 89 anos em São Paulo

A seus atores, eram constantes suas ordens, indicações e até proibições de todos os tipos. Tudo, segundo ele, para que a encenação fosse, em seu modo de ver, perfeita, e os atores estivessem no palco com atuações impecáveis.

Com a morte de Antunes se vai um modo de pensar o teatro que já havia sido superado inclusive por artistas contemporâneos a ele, caso de José Celso Martinez Corrêa, o Zé Celso, o outro mito do nosso teatro, dono de uma proposta de teatro mais livre e antropofágica.

Antunes Filho (1929-2019) – Foto: Bob Sousa – Blog do @miguel.arcanjo – UOL

Em 2013, em entrevista a este colunista quando lançava a peça “Nossa Cidade”, seu último grande sucesso nos palcos que lhe rendeu os prêmios APCA e Shell, quando questionado para onde iria o teatro brasileiro, Antunes respondeu de forma enfática:

“A pergunta não é para onde vai o teatro brasileiro. É para onde vai o teatro no mundo? Esta que é a questão. Está uma falta de dramaturgia, os atores estão mais preocupados só com dinheiro. Aliás, o mundo está preocupado só em correr atrás da grana. Se matando, se jogando, se suicidando. Essa história de consumo está enchendo o saco. Não aguento mais. O ator também vive isso de uma forma violenta. Já lá se foi o modernismo, já se foram certos valores, não tem mais aquilo. É pé no acelerador e vamos nessa.”

Antunes Filho durante entrevista ao jornalista Miguel Arcanjo Prado em 2013 no CPT (Centro de Pesquisa Teatral) – Foto: Bob Sousa @bobsousa – Blog do @miguel.arcanjo – UOL

Antunes era consciente que era uma espécie de último representante de um modo de enxergar a arte da qual foi grande mestre, goste-se ou não do seu trabalho.

Até esta terça, ao lado de José Celso Martinez Corrêa, o Zé Celso — como já dito, com pensamento teatral completamente distinto ao de Antunes —, formou a dupla de diretores vivos mais importantes do teatro brasileiro. Zé Celso agora segue sozinho neste posto de mito vivo.

Dono de apurado senso estético e amante de excelentes filmes e literatura clássica, Antunes imprimia seu gosto a qualquer ator que desejasse ser por ele moldado. A primeira foi Nicette Bruno, que foi madrinha de sua estreia como diretor em 1953 com “Weeck-end”.

E foram muitos os que desejaram e conseguiram passar por suas mãos, porque ele também era conhecido por rejeitar de forma veemente candidatos a trabalhar sob sua rédea.

Alguns pupilos depois tornaram-se grandes astros e estrelas não só do teatro como também da televisão e do cinema, caso de Laura Cardoso, Regina Duarte, Eva Wilma, Raul Cortez, Giulia Gam, Luis Mello, Lee Taylor, Cacá Carvalho, Bete Coelho, Lulu Pavarin, Marco Antônio Pâmio, entre tantos outros.

Todos, mesmo já longes do mestre no cotidiano frenético da profissão, jamais deixaram de apontá-lo como grande referência.

E é isso que fica para sempre de Antunes Filho, os profundos pilares que ele ajudou a erguer para o nosso teatro brasileiro, do qual foi e continuará sendo imprescindível alicerce, sobre os quais se ergueram edificações que, mesmo quando ele não as reconhecia, havia em suas bases suas severas e competentes mãos.

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Antunes Filho (1929-2019) – Foto: Bob Sousa @bobsousa – Blog do @miguel.arcanjo – UOL