Crítica | João Suplicy abraça sofisticada brasilidade em Samblues

Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo
O cantor e compositor João Suplicy sempre foi um músico habilidoso em criar diálogos com sonoridades distintas, criando sua música sempre com uma camada de fina sofisticação. Em seu novo show e álbum, Samblues, ele fusiona o que se convencionou chamar de música brasileira com elementos do blues. O concerto foi visto por este crítico em um comportado Blue Note São Paulo, na noite da última sexta, 4 de fevereiro.
É preciso ressaltar que ambos sons bebem de uma fonte inesgotável de ritmo e suingue: a ancestralidade africana, presente de forma seminal tanto na música brasileira quanto na estadunidense, e agora evocada com o devido respeito por João Suplicy. Afinal, ele é brasileiro e, neste show, presta nobre reverência à música que seu país produziu e que figura entre as melhores do mundo.
E João Suplicy busca esse diálogo de forma autêntica, tal qual no passado buscou Vinicius de Moraes quando se uniu a Baden Powell para criar os lendários Afro-sambas em 1966, até hoje no topo do mais sofisticado que a música brasileira conseguiu experimentar, na criação que é até os dias atuais a simbiose perfeita entre o samba, a bossa nova e o jazz.

O músico paulistano faz a costura musical entre o samba e o blues tendo como aliada uma potente banda, formada pela delicadeza de Cesar Augusto no piano, Ingrid Cavalcanti em seu suntuoso contrabaixo, Diego Pereira com sua precisa bateria e Vitor da Candelária com sua eloquente percussão.
Trilhando caminho novo, João Suplicy presta reverência a nomes importantes do samba, como Cartola, Paulinho da Viola e Leci Brandão, não deixando também de dialogar com ícones internacionais, sobretudo do blues criado na parte sul dos Estados Unidos.
Em Samblues, João Suplicy cria uma antropofagia sonora que é típica desta metrópole chamada São Paulo desde os tempos da Tropicália de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé, Rita Lee, Nara Leão e turma, movimento que, por sua vez, foi uma evolução natural do pensamento da agora centenária Semana de Arte Moderna de 1922.

Se a tristeza e o lamento típico do blues rondam certa parte do show, é na alegria do samba que ele reside de fato. Afinal, o ritmo brasileiro por excelência sublima a dor do racismo e da pobreza extrema em um ritmo que pulsa no compasso da felicidade que é forma de resistir, de seguir vivendo.
E o Brasil explodiu ao fim do show visto por este crítico, quando o artista convidou ao palco músicos de seu bloco de Carnaval, Tins e Bens e Tais, que pega o nome emprestado de letra de Podres Poderes, de Caetano Veloso.
Aliado à sua virtuosa banda, fizeram a folia acontecer neste fevereiro de Carnaval proibido na elegante sala da Avenida Paulista os ritmistas Tiago dos Anjos, Antonio Carlos AC de Sousa e Danilo Buiu. Juntos eles provaram que o blues de João Suplicy tem samba de sobra e com mais do que uma nota só.
Samblues, de João Suplicy
Avaliação: Muito Bom ✪✪✪✪
Crítica por Miguel Arcanjo Prado
Editado por Miguel Arcanjo Prado
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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige Blog do Arcanjo e Prêmio Arcanjo. Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Cultura pela USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por Globo, Record, Folha, Ed. Abril, Huffpost, Band, Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Integra os júris: Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio do Humor, Prêmio Governador do Estado, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Prêmio DID, Prêmio Canal Brasil. Venceu Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio ANCEC, Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade do Prêmio Governador do Estado.
Foto: Rafa Marques
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