Falta de negros na programação gera protesto no FIT-BH

Cena da peça Real, do Espanca!: manifesto ao fim - Foto: Kika Antunes/Divulgação

Real, do Espanca!, com o ator Alexandre de Sena: manifesto ao fim – Foto: Kika Antunes/Divulgação

Por Miguel Arcanjo Prado
Enviado especial a Belo Horizonte (MG)*

Os atores da peça “Real”, do grupo mineiro Espanca!, leram um manifesto ao fim da sessão de estreia no FIT-BH (Festival Internacional de Teatro, Palco & Rua de Belo Horizonte), no Teatro Francisco Nunes, nesta segunda (23).

Intitulado “Manifesto da Frente de Teatro de Belo Horizonte – Funarte MG Ocupada”, o texto fala em “grave momento de ruptura da ordem democrática que vivemos” e faz acusações ao festival, dizendo que ele tem contornos “anti-democráticos”, por não ter havido seleção pública para os espetáculos locais, e “racistas”, por não haver entre as 70 atrações trabalhos de teatro negro.

Segundo o manifesto dos artistas, desde a extinção da Secretaria Municipal de Cultura de Belo Horizonte, transformada em Fundação Municipal de Cultura em 2006, vem sendo reduzido o diálogo com a sociedade no FIT-BH, com “progressivo fechamento dos canais de interlocução com artistas e trabalhadores da cultura, especialmente os que defendem a representatividade negra e LGBT”.

Rodrigo Jerônimo, do Grupo dos Dez: carta de repúdio - Foto: Divulgação

Rodrigo Jerônimo, do Grupo dos Dez: carta de repúdio – Foto: Divulgação

Carta de repúdio

A ausência de negros na programação do FIT-BH já havia gerado uma carta de repúdio do Grupo dos Dez, que luta por políticas afirmativas na cultura mineira, quando do lançamento da programação. Um de seus integrantes, o ator Rodrigo Jerônimo, afirma ao UOL que “há uma má vontade” de se olhar para o teatro negro no FIT-BH.

“Queremos uma legislação que garanta a presença do teatro negro nos editais de cultura, no festival e também de representantes negros nas comissões avaliadoras”, afirma. “Excluir a cena negra produzida nos últimos dois anos no FIT-BH é um ato racista e excludente”, define. E faz outra reclamação: “A seleção das peças locais do FIT-BH sempre foi feita por edital. Este ano foi feita por convite, sem chamamento público, o que considero absurdo”, diz Jerônimo.

A performer Cristal Lopez  - Foto: Diego Moreira Fotografia

A performer Cristal Lopez: “Queremos estar no palco também” – Foto: Diego Moreira Fotografia

“Não queremos ser só plateia”

Os representantes da comunidade artística negra se encontraram com a direção da Fundação Municipal de Cultura, responsável pelo FIT-BH, no começo do mês. Estiveram presentes os artistas Rodrigo Jerônimo, Felipe Soares, Bia Nogueira, Lucas Costa, Denilson Tourinho, Markim Cardoso, Rodrigo Ferrari e Rosália Diogo. Na reunião, a carta de repúdio foi entregue. A direção afirmou na ocasião estar aberta ao diálogo democrático no intuito de incluir o negro nas próximas edições.

A ausência repercute na comunidade artística negra mineira. Ícone da cena cultural de Belo Horizonte, a artista Cristal López diz ao UOL que ficou indignada. “Falta os curadores pesquisarem mais. Hoje não dá mais para falar que não ficou sabendo de peça com temática negra, porque tem Google. Querem embranquecer o festival. Até quando a arte negra não vai ser considerada arte? Não queremos ser só plateia, queremos estar no palco também. Temos muitas histórias para contar”, declara a performer.

O UOL procurou a direção do FIT-BH, que preferiu preferiu não se manifestar.

*O jornalista Miguel Arcanjo Prado viajou a convite do FIT-BH.

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