Camila Nunes Rocha se destaca como mulher negra diretora do Lanterna Mágica Festival Internacional de Animação em Goiânia, Goiás

Por VIVIVANE PISTACHE
Especial para o Blog do Arcanjo
Enviada especial a Goiânia – GO*
Mulher negra no comando de um grande festival internacional de cinema é um feito que coloca Camila Nunes Rocha em destaque no mercado cultural audiovisual brasileiro e internacional. Ela dirige o Lanterna Mágica Festival Internacional de Animação, em Goiânia, Goiás, que realiza sua sexta edição de 19 a 24 de março de 2024.
Esse processo não foi fácil, ainda preciso me validar o tempo todo. Confesso que tem dias que acho que sou louca. Por que eu estou fazendo isso, trabalhando com animação? Ainda mais fora do eixo? Eu, uma mulher negra nisso tudo, é muito difícil, porque a animação ainda tem um retrato elitista branco, sabe? Sempre quis fazer este festival, desde a época de faculdade em cinema pela Universidade Estadual de Goiás. Eu me encontrei, eu me achei na animação.
Camila Nunes Rocha
diretora do Lanterna Mágica Festival Internacional de animação – Goiânia GO
Magia é uma senha corrente no universo do cinema, e adentrar na intimidade dos bastidores é uma oportunidade singular de conhecer as muitas receitas do milagre que se revela nas telas. Considerando os desafios de se fazer cinema de animação no Brasil, o Lanterna Mágica é uma profissão de fé numa técnica ainda tão subestimada pela cinefilia e pelas políticas públicas de fomento.
Um triste sintoma disso é que grandes festivais de animação do país como o Anima Mundi, Animacine, Festival Internacional de Animação do Agreste e o Festival Brasil Stop Motion deixaram de existir mesmo após o Brasil ter sido representado no Oscar de 2016 com O Menino e o Mundo do Alê de Abreu.

Apesar desse cenário desalentador, a sexta edição do Lanterna Mágica vem “robusta”, com uma dezena de mostras competitivas e não competitivas, com produções vindas de oito estados brasileiros e onze países. A Mostra Internacional traz ainda especial destaque para animações africanas e latino-americanas com a Mostra Gondwana. Nessa diáspora da animação, o Lanterna Mágica faz parceria com o Animage, uma importante janela das animações africanas realizada em Recife há quatro edições.
Sediado no CineX, um espaço de cinema vip dentro do Centro Cultural Oscar Niemeyer, em Goiãnia, Goiás, além das exibições, o Lanterna Mágica traz ainda atividades de formação e de mercado, com a presença de representantes dos filmes da competitiva nacional e da Mostra Gondwana, além da formação de público infanto-juvenil com a presença massiva de estudantes da rede pública da cidade.
Quem assume o cajado para a travessia desse oceano de filmes, pessoas e conexões é Camila Nunes Rocha, que dirigiu e idealizou essa edição. O fato de ser mulher negra, mãe e do centro-oeste amplia critérios para a construção do Lanterna Mágica que interpela ausências no calendário (inter)nacional de festivais de animação.
Situado no coração do país, em Goiânia, bem ao lado de Brasília, o Lanterna Mágica surgiu em 2017, é referendado no Anima Mundi e desde a sua primeira edição contou com a presença de animadores de renome nacional como Alê Abreu, Otto Guerra e Rosana Urbes. Camila Rocha, que também assina a direção do seu primeiro projeto de série de animação intitulado Ayla Violeta, nos conta um pouco sobre sua experiência à frente desse festival.

Atualmente o Lanterna Mágica é o único festival internacional de animação no Brasil que contempla os três eixos: exibição, formação e mercado.
Camila Nunes Rocha
diretora do Festival Lanterna Mágica – Goiânia – GO
“Esta edição é a primeira que eu estou fazendo essas parcerias com outros festivais, como o Animage, festival de cinema de animação de Pernambuco. E aí eles têm uma mostra africana há quatro anos e pela primeira vez a gente está exibindo esses filmes da mostra africana aqui na Lanterna Mágica, a partir disso, dessa pesquisa pessoal mesmo de entender esses projetos e me conectar com esses projetos da diáspora”, conta.
E tem mais novidades: “A gente está criando também a Mostra Gondwana, que além de exibir filmes de África e das Américas, incluindo povos originários, a gente vai ter aqui no festival realizadores, negros, pessoas racializadas, realizadores indígenas que fazem animação. Então pra gente entender esses nichos e trazer esses outros formatos também, essa outra discussão”, diz.
Camila fala sobre ser uma mulher negra no comando de um evento cultural deste porte. “Esse processo não foi fácil, ainda preciso me validar o tempo todo. Confesso que tem dias que acho que sou louca. Por que eu estou fazendo isso, trabalhando com animação? Ainda mais fora do eixo? Eu, uma mulher negra nisso tudo, é muito difícil, porque a animação ainda tem um retrato elitista branco, sabe? Sempre quis fazer este festival, desde a época de faculdade em cinema pela Universidade Estadual de Goiás. Eu me encontrei, eu me achei na animação.”
Esta edição do Lanterna Mágica traz a partir de sua idealização e direção além de reivindicar maiores espaços para a animação no cenário do cinema nacional, uma aposta na diversidade de povos e histórias que são ainda mais invisibilizados no imaginário audiovisual.
Entre os dias 19 e 24 de março é possível conferir produções, cursos e rodadas de negócios. O filme convidado para a sessão de abertura é o aclamado e instigante longa Bizarros Peixes das Fossas Abissais de Marcelo Marão. Destaque ainda para a presença das animadoras Esther Kemin do Benim e Nyg Kuita, diretora Kaingang do Paraná, além do Carlos Cipriano, animador negro do MAM/RJ.
*Viviane Pistache é preta das Minas Gerais, pesquisadora, roteirista e, de vez em quando, crítica de cinema. Colabora com empresas como O2 Filmes e TV Globo. Viajou a convite do 6º Lanterna Mágica Festival Internacional de Animação, de Goiânia – GO.
Editado por Miguel Arcanjo Prado
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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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