Senhora dos Afogados ganha visão de Monique Gardenberg com Teatro Oficina em ponte com Zé Celso e Nelson Rodrigues

Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo
O Teatro Oficina Uzyna Uzona, celeiro de transgressão e palco de reinvenções, volta a agitar as águas da cena paulistana. Desde a última sexta, 25 de abril, e com extensão programada para o seu icônico endereço a partir de 30 de maio, o grupo apresenta no Sesc Pompeia uma leitura visceral de “Senhora dos Afogados”, a emblemática tragédia de Nelson Rodrigues, sob a direção da sensível Monique Gardenberg.
Para quem acompanha a trajetória incandescente do Oficina, a montagem carrega um peso simbólico eloquente. A peça, um desejo antigo do mestre Zé Celso Martinez Corrêa – parceiro de Nelson em tantas trincheiras artísticas –, ganha vida pelas mãos de Gardenberg, amiga íntima e agora herdeira de um legado de ousadia.

A decisão, como revela Marcelo Drummond, viúvo de Zé Celso à frente do grupo e intérprete do atormentado juiz Misael, surgiu em um momento de luto e aposta no futuro: “Monique perguntou o que faríamos depois de ‘A Queda do Céu’, e eu logo respondi que gostaria de fazer ‘Senhora dos Afogados’ antes. Queria estar no palco logo.”
O texto rodrigueano, ambientado em uma casa à beira-mar que pulsa como extensão do próprio oceano – metáfora poderosa para as correntes da vida, da morte e da memória –, é revisitado com a marca indelével do Oficina. A inovação cênica, a incorporação de recursos audiovisuais e a atmosfera musical intensificam a imersão no universo denso da família Drummond, onde segredos e culpas emergem como ondas implacáveis.

Um coro peculiar, as “putas do cais”, evoca a memória afetiva de Zé Celso e sua inclinação por dar voz aos marginalizados, injetando uma camada extra de visceralidade à encenação. No elenco, nomes potentes como Regina Braga, Leona Cavalli e Lara Tremouroux dão corpo às personagens complexas que orbitam o melancólico Misael.
A passagem de “Senhora dos Afogados” pelo Sesc Pompeia não é um evento isolado, mas sim a continuidade de uma frutífera parceria. Nos últimos anos, o Oficina brindou o público com releituras impactantes de “Esperando Godot” e “O Bailado de Deus Morto”, sempre dialogando com as artes visuais e expandindo as fronteiras do teatro.
Agora, a tragédia familiar de Nelson Rodrigues, filtrada pela lente única do Teatro Oficina e o olhar de Monique Gardenberg, convida o espectador a mergulhar em um Brasil arquetípico, onde as paixões toldam a razão e o silêncio grita mais alto que as palavras. Imperdível para os amantes do teatro que pulsa e questiona. Que as águas cênicas lavem e revelem!
Senhora dos Afogados
Ficha Técnica:
Família Drummond
Misael Drummond – Marcelo Drummond
Dona Marianinha – Regina Braga
Dona Eduarda – Leona Cavalli
Moema – Lara Tremouroux
Paulo – Kael Studart
Dora – Clarisse Johansson
Clarinha – Larissa Silva
Vizinhas
Cristina Mutarelli
Giulia Gam
Michele Matalon
Muriel Matalon
Cais
Noivo – Roderick Himeros
Mãe do Noivo – Sylvia Prado
Dona – Vick Nefertiti
Vendedor de Pentes – Marcelo Dalourzi
Sabiá – Alexandre Paz
Mulheres da Vida: Danielle Rosa,
Kelly Campêllo, Mariana de Moraes,
Selma Paiva, Zizi Yndio do Brasil
Michês: Tony Reis, Victor Rosa
Banda: Carlos Eduardo Samuel,
Felipe Botelho, Pedro Gongom Manesco
Realização:
Teat(r)o Ofi cina Uzyna Uzona
Texto:
Nelson Rodrigues
Direção:
Monique Gardenberg
Direção de Vídeo:
Igor Marotti Dumont
e Ciça Lucchesi
Arquitetura Cênica:
Marília Piraju
Figurino:
Cássio Brasil
Visagismo:
Sonia Ushiyama Souto
Desenho de luz:
Wagner Pinto e Sarah Salgado
Direção Musical:
Felipe Botelho
Direção de Cena:
Elisete Jeremias
e Rafael Bicudo
Artistas Homenageados:
A fotografia de José Celso Martinez Corrêa é de autoria de André Gardenberg.
O poema Perplexidade, declamado por Misael Drummond no último ato, é de autoria de Antonio Cícero.
A coreografia que abre a cena do Banquete é Season’s March Dance, de autoria de Pina Bausch, com a música Você Vai Ser o Meu Escândalo, de Erasmo e Roberto Carlos.
Citações:
As roupas usadas pela Família Drummond na cena de abertura foram estampadas com obra de Adriana Varejão, Celacanto provoca maremoto.
2004-08, óleo e gesso sobre tela.
A placa da praia foi produzida a partir de obra de Gabriel Grecco – Tá foda.
Serviço
Senhora dos Afogados
De: 25 de abril a 11 de maio de 2025. Terça a sábado, às 20h. Domingos e feriados, às 18h. Dia 10/05, às 16h, sessão extra.
R$ 21 | R$ 35 | R$ 70
Sesc Pompeia
Endereço: Rua Clélia, 93 Pompeia – São Paulo| SP
Telefone: (11) 3871-7700
https://www.sescsp.org.br/programacao/senhora-dos-afogados
Editado por Miguel Arcanjo Prado
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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige Blog do Arcanjo e Prêmio Arcanjo. Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Cultura pela USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por Globo, Record, Folha, Ed. Abril, Huffpost, Band, Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Integra os júris: Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio do Humor, Prêmio Governador do Estado, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Prêmio DID, Prêmio Canal Brasil. Venceu Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio ANCEC, Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade do Prêmio Governador do Estado.
Foto: Rafa Marques
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