★★★★★ Crítica: Caetano Veloso Transa 50 Anos é o show do ano com direito a transe coletivo

Caetano Veloso brilha no show Transa 50 Anos: transe coletivo apoteótico com músicos lendários no melhor show de 2023 © Rafael Strabelli Divulgação Espaço Unimed Blog do Arcanjo 2023

Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo

Caetano Veloso: Transa – 50 Anos
★★★★★ Ótimo

No show Transa 50 Anos, que celebra as cinco décadas de seu icônico álbum gravado no exílio em Londres e lançado no Brasil em 1972, Caetano Veloso demonstra mais uma vez a genialidade que faz dele um dos maiores músicos do mundo. E evidencia que segue com uma voz límpida, cantando, aos 81 anos, com ainda mais técnica do que quando tinha 30 — idade com a qual fez o fabuloso disco. Uma verdadeira proeza na construção daquele que é o show do ano de 2023.

O público que esteve no Espaço Unimed, em uma São Paulo com clima londrino de garoa, chuva e friozinho em plena primavera, nesta segunda, 27 de novembro, pôde constatar isso mais uma vez, com direito a momentos de assombro, catarse e transe coletivos.

Transa 50 Anos: Caetano Veloso faz o melhor show do ano acompanhado por músicos virtuosos © Rafael Strabelli Divulgação Espaço Unimed Blog do Arcanjo 2023

Paula Lavigne, grande maestra do conglomerado criativo Caetano Veloso, demonstra mais uma vez sua força produtiva ao reunir no palco, 52 anos depois, aqueles mesmos músicos que fizeram história naquele Chappells Studio de Londres, comandado pelos hábeis engenheiros John Iles e Colin McLeish sob direção do perspicaz produtor musical Ralph Mace, que fez história na Sweet London dos anos 1970.

Jards Macalé no show Transa 50 Anos: diretor musical, guitarrista e violonista do álbum icônico de Caetano Veloso lançado em 1972 repete virtuosismo em 2023 © Rafael Strabelli Divulgação Espaço Unimed Blog do Arcanjo 2023
Transa 50 Anos: O baterista Tutty Moreno e o percussionista Áureo de Souza repetiram seu virtuosismo do disco de 1972 no palco de 2023 ao lado de Caetano Veloso © Rafael Strabelli Divulgação Espaço Unimed Blog do Arcanjo 2023

Transa tem banda histórica virtuosa e atemporal

Aquela incrível banda que fez o histórico disco e show Transa em 2 de novembro de 1971 no Queen Elizabeth Hall em Londres, foi formada por Caetano Veloso na voz e violão, Jards Macalé, no violão, guitarra e direção musical, Tutty Moreno, na bateria, Áureo de Souza, na percussão, e Moacir Albuquerque (1945-2000), no baixo e que, infelizmente, não conseguiu viver para este retorno e foi homenageado no palco pelos colegas.

Outra ausência sentida e digna de igual homenagem foi a de Gal Costa, que fez participações soberbas com sua límpida voz em You Don’t Know Me, Neolitic Man e Nostalgia (That’s What Rock’n Roll Is All Albout). A segunda mulher presente naquele incrível bando majoritariamente masculino foi Angela Ro Ro, a nossa rainha do blues, de volta à banda para fazer sua incrível gaita em Nostalgia, canção que fecha o disco e o show.

A este dream team reunido se soma a excelente banda atual de Caetano Veloso, formada pelos exímios músicos Lucas Nunes (guitarra, violão), Rodrigo Tavares (teclados), Alberto Continentino (baixo), Kainã do Jejê, Thiago da Serrinha e Pretinho da Serrinha (bateria e percussões), capazes de tudo e mais um pouco.

Na plateia da Barra Funda, o público era majoritariamente jovem, mas também havia os old schools da Tropicália, todos ávidos fãs de Caetano e de seu icônico discobjeto com criação de Álvaro Guimarães e planejamento gráfico de Aldo Luiz, relançado em LP em 2022 e verdadeira obra de arte manipulável.

Enquanto lá fora a garoa fazia os termômetros marcarem 21 graus, na plateia do Espaço Unimed para Transa 50 Anos o clima era bem mais quente, impondo um verão baiano na São Paulo de ares londrinos.

Transa 50 Anos: Caetano Veloso faz o melhor show do ano acompanhado por músicos virtuosos © Rafael Strabelli Divulgação Espaço Unimed Blog do Arcanjo 2023

Músicas pré e pós Transa

Além de fazer as sete faixas de Transa, Caetano pinçou para o repertório de pouco mais de duas horas de show, canções pré-Transa e pós-Transa, como chamou, e que conversam com o clima do disco.

Assim, o público teve a chance de ouvir Irene, canção feita para sua irmã caçula, na prisão antes do exílio em Londres, ou Araçá Azul, composta já no retorno ao Brasil.

Neste bojo pré-Transa ainda estiveram Maria Bethânia, The Empty Boat — com Caetano dizendo que foi a primeira música que compôs em inglês e que ficou estupefato com o fato de uma fã nova-iorquina dizer que amava a letra da canção, que ele não considera sua melhor performance no idioma (ele prefere Nine Out Of Ten) — e London, London, gravada por ele em 1971 e regravada pelo RPM, com a voz de Paulo Ricardo, no estourado disco Rádio Pirata, de 1986, quando se tornou um megahit radiofônico.

Transa 50 Anos tem clássicos cinquentões entoados por público jovem

O show começou com a faixa que abre Transa, You Don’t Know Me, composição de Caetano Veloso. Como um mantra, o público cantou cada um dos versos. A canção é repetida outra vez no meio do show, com a chegada dos velhos companheiros ao palco.

Nine Out Of Ten, também composição de Caetano e famosa pelo verso “I’m Alive” — que ele me repetiu em uma inesquecível entrevista de 2007 —, surge com a releitura da charmosa prévia à canção da gravação do então desconhecido reggae obtido na Portobello Road londrina, point dos jamaicanos na efervescente Londres dos anos 1970.

Em cenografia minimalista com tijolos de led ao fundo, que ganhavam mais viço quando se iluminavam com o vermelho que marca o álbum Transa, Caetano Veloso estava de calça e sapato pretos e vestido com uma elegante camisa vermelha com detalhe preto na gola, envelopado tal qual o projeto gráfico do álbum em um acerto do stylist Felipe Veloso, que nos últimos anos veste com precisão e charme o grande artista.

Nas participações especiais, Jards Macalé ganhou seu momento solo entoando Mal Secreto e fez ao lado de Caetano Corcovado e Sem Samba Não Dá, o hit contemporâneo em que Caetano cita novos nomes da música brasileira como Duda Beat e Simone e Simaria.

De volta a Transa, Triste Bahia, de Caetano Veloso baseado em Gregório de Mattos, Neolithic Man e It’s a Long Way, ambas compostas por Caetano, levantaram o público e provocaram um mergulho musical absoluto no público, assim como Mora na Filosofia, de Arnaldo Passos e Monsueto.

Transa 50 Anos: Angela Ro Ro e Caetano Veloso roçam a língua no palco do Espaço Unimed © Rafael Strabelli Divulgação Espaço Unimed Blog do Arcanjo 2023

Angela Ro Ro brilha com seu charme e grande voz

Dona de voz única e charme peculiar, Angela Ro Ro brilhou em sua participação já na parte final do show. Generoso, Caetano foi para os bastidores para deixar a amiga dominar o público.

Ro Ro evidenciava estar feliz à beça com aquele momento de real consagração. Acompanhada de seu pianista, começou com Escândalo, composta por Caetano a seu pedido, em um momento em que estava numa fossa danada, como ela mesma contou. Na sequência, emendou Compasso e, por fim, seu grande blues, Amor, Meu Grande Amor, de seu primeiro disco, de 1979, reavivado no coração do público mais jovem pela gravação do Barão Vermelho em seu MTV Acústico de 1996 no vozeirão de Frejat.

Ro Ro foi ovacionada em sua participação e, ao encerrar seu momento de primazia antes do retorno de Caetano ao palco, lembrou que um artista é feito não pelas gravadoras, rádio ou imprensa, mas pelo amor do público que faz com que este não desapareça, provocando emoção em todos.

Angela Ro Ro em Transa 50 Anos: ponto alto do show com farto amor da grande cantora pelo público © Rafael Strabelli Divulgação Espaço Unimed Blog do Arcanjo 2023

O diálogo de Caetano com Macalé e Ro Ro deixaram o show mais especial e único. O que poderia ser apenas uma mera reprodução de um álbum, virou um fervoroso diálogo com o aqui e agora dessas pessoas que o ajudaram a construir um dos mais talentosos álbuns da história da música mundial.

Final apoteótico

Para o final apoteótico, com Caetano de volta ao centro do palco, Ro Ro foi para a sua nova gaita — presente de Paula Lavigne — e a banda completa mandou Nostalgia (That’s What Rock’n Roll Is About). O público desfrutou cada segundo da última canção.

A ovação foi total e os músicos saíram do palco aos berros por “mais um”. Caetano e seus geniais músicos foram condescendentes ao insistente pedido e retornaram para repetir Nine Out of Ten, com direito àquela já mencionada introdução de reggae.

Quando as luzes do palco se apagaram e as da plateia se acenderam, a sensação ao deixar o Espaço Unimed era só uma: a de ter presenciado uma noite histórica da música. Como Ro Ro pregou anteriormente no palco, todos fomos imensamente abençoados mais uma vez pela genialidade deste ser chamado Caetano Veloso neste que é o show do ano.

Caetano Veloso: Transa – 50 Anos
★★★★★
Avaliação: Ótimo
Crítica por Miguel Arcanjo Prado

Agradecimentos: Fabiana VillelaTalento Comunicação, Espaço Unimed, Paula LavigneUns Produções e Juan Manuel Tellategui.

Transa 50 Anos: Caetano Veloso faz o melhor show do ano acompanhado por músicos virtuosos © Rafael Strabelli Divulgação Espaço Unimed Blog do Arcanjo 2023
Transa 50 Anos: Caetano Veloso faz o melhor show do ano acompanhado por músicos virtuosos © Rafael Strabelli Divulgação Espaço Unimed Blog do Arcanjo 2023

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Jornalista cultural influente e respeitado no Brasil, Miguel Arcanjo Prado é CEO do Blog do Arcanjo, fundado em 2012, e do Prêmio Arcanjo, desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Coordena a Extensão Cultural da SP Escola de Teatro e apresenta o Arcanjo Pod. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por Globo, Record, R7, Record News, Folha, Abril, Huffpost Brasil, Notícias da TV, Contigo, Superinteressante, Band, CBN, Gazeta, UOL, UMA, OFuxico, Rede TV!, Rede Brasil, Versatille, TV UFMG e O Pasquim 21. Integra o júri de Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de São Paulo, Prêmio Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Prêmio Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil de Curtas. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação Nacional ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade do Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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