★★★ Crítica: Experimento Concreto questiona colorismo com peça-tese no Festival de Curitiba que faz pensar

Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo
ENVIADO ESPECIAL AO FESTIVAL DE CURITIBA*
★★★
Experimento Concreto
Avaliação: Bom
A teoria do colorismo, pela qual as pessoas negras de pele mais escura sofrem mais racismo do que as de pele mais clara, é objeto de confronto na peça-tese Experimento Concreto, apresentada no 31º Festival de Curitiba na Mostra de Solos na Casa Hoffmann em dupla sessão no último domingo, 2 de abril.
A obra é uma realização da Plataforma Araká, formada pela dupla de artistas baianos Laís Machado e Diego Araúja, que assinam texto, direção, caracterização e arte da peça com iluminação de Luiz Guimarães e atuação de Laís.
No solo minimalista, a atriz faz o que define como “palestra-performance”, que visita a questão racial na formação do Brasil, sobretudo a partir da abolição da escravidão e da formação da República, no fim do século 19.
Citando autores renomados na temática, a peça foca no pardo, rememorando desde a imigração de europeus como forma de embranquecer a população brasileira até a violência policial atual contra negros, reconhecidos pelo IBGE como a somatória de pretos e pardos, fruto de árdua luta do movimento negro, já que é esta união que torna negros a maioria da população brasileira.
Se boa parte do recente movimento negro jovem atual adotou o colorismo como regra, sobretudo em posts que rendem farto engajamento nas redes sociais, o espetáculo busca justamente mostrar que o uso de tal tese pode ser perigoso para o próprio movimento negro e a população negra como um todo.
Já o colorismo levado a ferro e fogo provoca que pardos tenham medo novamente de assumir-se negros, podendo até mesmo sofrer perseguição por tal atitude, apelidados de “afrobeges” ou “afroconvenientes” por parte da militância.
O corajoso espetáculo, já aborda tema tão espinhento quanto as taças de cristal que a atriz quebra ao longo da encenação. associa a teoria colorista como aliada do mercado, com suas divisões de nichos para facilitar o consumo.
A peça-palestra, que se assemelha a uma defesa acadêmica com levíssimas pitadas teatrais, recorre à voz em off de Sueli Carneiro, grande nome do movimento negro no Brasil, criticando a visão do colorismo.
Ao fim, a atriz entrega um QR code ao público, para que possa acessar as referências bibliográficas do tema, instigando a leitura, o que é sempre salutar.
O público pode concordar ou não com a hipótese apresentada pela peça-tese, mas certamente sairá com vontade de refletir mais sobre o tema. Afinal, o teatro serve para fazer pensar, não é mesmo?
No livro argentino Martín Fierro, há um trecho excelente que diz: “Os irmãos sejam unidos, porque esta é a lei primeira. Porque, se brigam entre eles, os devoram os de afora”. A citação serve como metáfora que se encaixa perfeitamente na provocação de Experimento Concreto.
★★★
Experimento Concreto
Avaliação: Bom
Crítica por Miguel Arcanjo Prado
*O jornalista e crítico Miguel Arcanjo Prado viajou a convite do Festival de Curitiba.
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Editado por Miguel Arcanjo Prado
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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige Blog do Arcanjo e Prêmio Arcanjo. Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Cultura pela USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por Globo, Record, Folha, Ed. Abril, Huffpost, Band, Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Integra os júris: Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio do Humor, Prêmio Governador do Estado, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Prêmio DID, Prêmio Canal Brasil. Venceu Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio ANCEC, Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade do Prêmio Governador do Estado.
Foto: Rafa Marques
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