★★★★ Crítica: Brenda Lee e o Palácio das Princesas comove Festival de Curitiba com história de resistência trans

Veronica Valenttino em Brenda Lee e o Palácio das Princesas no 31º Festival de Curitiba © Blog do Arcanjo 2023 Humberto Araujo – Agência Daniel Sorrentino @festivaldecuritiba

Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo

ENVIADO ESPECIAL AO FESTIVAL DE CURITIBA*

Com João Schelbauer

★★★★
Brenda Lee e o Palácio das Princesas
Avaliação: Muito Bom

Para você que não é trans, quanto tempo você duraria nesta pele? Este é um dos questionamentos levantados pelo musical Brenda Lee e o Palácios das Princesas, que esgotou três sessões no Festival de Curitiba, inclusive uma extra. O musical levou três das mais importantes premiações do país: Prêmio Bibi Ferreira, Prêmio Arcanjo de Cultura e Prêmio Shell, sendo que o primeiro e o último premiaram Verônica Valenttino como Melhor Atriz, primeira trans a conseguir tal feito. A obra é inspirada na biografia da travesti Brenda Lee, referência na luta LGBTQIAP+ no Brasil.

Brenda Lee e o Palácio das Princesas faz sucesso no 31º Festival de Curitiba © Blog do Arcanjo 2023 Humberto Araujo – Agência Daniel Sorrentino @festivaldecuritiba

Os questionamentos levantados na peça trazem à tona uma realidade que não é recente, mas que permeia a existência humana e, desde sempre, tratada com desdém nas sociedades.

O grandioso espetáculo é vivido por 6 atrizes travestigêneres, Verónica Valenttino, a protagonista, e Olivia Lopes, Leona Jhovs, Rafaela Bebiano, Andreya Rosa Sá e Tyller Antunes. Isso deixa o musical ainda mais profundo com a legitimidade da repressentividade que propõe.

As cenas inicias trazem a história de como foi o processo de descoberta de cada uma. Julgamentos, intolerância religiosa e pressão familiar são os aspectos externos que mais aparecem e são detalhados nas cenas.

Brenda Lee dava oportunidades e esperança às travestis que a procuravam em busca de um lar, vindas de um cenário de escassez de trabalho, preconceito e o diagnóstico da Aids, em uma época em que a doença era pouco conhecida, não havia remédios desenvolvidos e era vista com muito proconceito.

Mas isso não impedia Brenda de acolher aquelas meninas que a procuravam. Trazer à tona a história dessa mulher tão pouco conhecida, neste país que ainda apaga figuras históricas que não estão no padrão dominante, é um dos grandes méritos desta peça.

Brenda Lee e o Palácio das Princesas faz sucesso no 31º Festival de Curitiba © Blog do Arcanjo 2023 Humberto Araujo – Agência Daniel Sorrentino @festivaldecuritiba

As reflexões propostas pelo musical apresentam uma realidade gritante e ensurdecedora. Frases como “precisa ter muita força pra aguentar”, “a cidade inteira quer me matar” e “juntar os nossos nadas, proteger as manas e viver aqui em paz” são alguns dos trechos do musical.

O espetáculo traz diálogos pertinentes que explicitam a violência policial, o sentimento de culpa pela originalidade de cada uma e o medo de andar com a cabeça erguida pelas ruas. Ele ainda mostra a forma como se inverte a situação quando tudo isso se trata da parcela trans da sociedade, deixando o público com pontos de interrogação que não serão respondidos facilmente.

A obra, com pouco menos de duas horas de palco, mostra que a vida de Brenda Lee teve um rumo diferente do que ela almejava no início, mas essa mudança de percurso foi convictamente para melhor, já que ela mudou não só sua vida mas de muitos e muitas manas.

Apesar de seu final trágico, Brenda Lee deixou incontestável legado e tornou-se um marco para a comunidade LGBTQIAP+ no Brasil.

A belíssima obra presente no 31° Festival de Curitiba, apesar de ser baseada em uma história do século passado, lamentavelmente se repete nos dias atuais. A violência e a perseguição e a resistência com a qual a comunidade LGTQIAP+ convive, está presente desde as grandes capitais até os interiores mais escondidos, com sua hipocrisia costumeira.

E quando falamos em interiores, não é apenas uma questão de geolocalização, mas também no interno de cada pessoa que vive o processo constante de descoberta ou rechaço da beleza de sua identidade.

Brenda Lee e o Palácio das Princesas faz história no teatro brasileiro com sua temática e com suas atrizes em cena. Que não seja apenas um episódio momentâneo, mas que seja o cotidiano dos palcos brasileiros legitimarem corpos trans. Quando isso for algo cotidiano, o legado de Brenda Lee estará completo.

Brenda Lee e o Palácio das Princesas faz sucesso no 31º Festival de Curitiba © Blog do Arcanjo 2023 Humberto Araujo – Agência Daniel Sorrentino @festivaldecuritiba

Brenda Lee e o Palácio das Princeas

FICHA TÉCNICA
Direção: Zé Henrique de Paula.
Atrizes:Verónica Valenttino, Olivia Lopes, Leona Jhovs, Rafaela Bebiano, Andreya Rosa Sá e Tyller Antunes, além da participação do ator Fabio Redkowicz.
Dramaturgia e letras: Fernanda Maia
Direção e figurinos: Zé Henrique de Paula
Direção musical, música original e preparação vocal: Rafa Miranda

Atrizes de Brenda Lee e o Palácio das Princesas posam com exclusividade para o Blog do Arcanjo pela lente do fotógrafo Rafa Marques

*O jornalista e crítico Miguel Arcanjo Prado viajou a convite do Festival de Curitiba.

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Jornalista cultural influente e respeitado no Brasil, Miguel Arcanjo Prado é CEO do Blog do Arcanjo, fundado em 2012, e do Prêmio Arcanjo, desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Coordena a Extensão Cultural da SP Escola de Teatro e apresenta o Arcanjo Pod. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por Globo, Record, R7, Record News, Folha, Abril, Huffpost Brasil, Notícias da TV, Contigo, Superinteressante, Band, CBN, Gazeta, UOL, UMA, OFuxico, Rede TV!, Rede Brasil, Versatille, TV UFMG e O Pasquim 21. Integra o júri de Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de São Paulo, Prêmio Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Prêmio Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil de Curtas. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação Nacional ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade do Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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