Opinião: Dona Ivone Lara foi a voz de um povo

Dona Ivone Lara (1921-2018): matriarca do samba – Foto: Divulgação – Blog do Arcanjo/UOL

Dona Ivone Lara foi a grande matriarca do samba, a voz de um povo. Sucessora automática de Tia Ciata, na casa de quem o ritmo nasceu. Sua morte, aos 97 anos, deixa o surdo sem compasso, o cavaquinho desafinado, a cuíca sem rangido e um sentimento de que estamos todos órfãos.

“Alguém me avisou pra pisar nesse chão devagarinho”, ela cantava no que poderia ser lido também como uma metáfora de seu pioneirismo na música de ares machistas até hoje. Imagina no tempo dela. E, também, é claro da situação de opressão do negro no Brasil.

Nascida em 13 de abril de 1921, apenas 33 anos depois da vergonhosamente tardia abolição da escravatura no Brasil, Dona Ivone cantava a dor da negritude com a sabedoria de quem conviveu na infância com “negro que já foi escravo” e que precisava vencer o preconceito bradando: “negro sem emprego fica sem sossego”.

Leia também:

Durante todo o século 20 e na aurora deste século 21, Dona Ivone Lara reinou absoluta com a força impar de sua voz ancestral e o respeito irretocável que público, artistas e imprensa nutriam por esta incansável mulher negra pioneira.

Dona Ivone Lara é voz de respeito, é tradição, é o inconsciente coletivo de um povo. Em luto, ficamos todos em solidão, mas com a certeza de saber que a melhor forma de homenageá-la é estampar no rosto com ares de liberdade duramente conquistada o sorriso negro que ela nos ensinou, com vigor e altivez, a estampar e a cantar.

Siga Miguel Arcanjo no Instagram
Curta Miguel Arcanjo no Facebook
Acompanhe Miguel Arcanjo no Twitter

Please follow and like us: