Crítica: Casamento fracassado ganha ares de musical
Por Átila Moreno, no Rio
Especial para o Atores & Bastidores*
Todos os dias, a senhora Winnie acorda e enfrenta um dos piores inimigos do ser humano: a rotina de um casamento fracassado.
Esse é o mote para a peça Dias Felizes, inspirada na obra do dramaturgo irlandês Samuel Beckett (1906-1989).
O tema não é novo. Beckett já falava disso em 1961. No entanto, essa atual remontagem ganha uma mistura de musical e drama.
Também pesa tamanha responsabilidade, pois Fernanda Montenegro e Fernando Torres já atuaram numa adaptação brasileira, em 1995/96, com direção de Jacqueline Laurence.
Winnie carrega uma mala com inúmeros utensílios. Metáfora simples para aquilo que carregamos todos os dias. Quinquilharias dispensáveis que sobrecarregam coluna e alma.
Bem que a personagem tenta se desfazer de algumas coisas, como pasta de dente, escova e guarda-chuva, mas outras insistem perdurar. Principalmente, sua relação com Willie, um marido apático e dependente.
A semelhança entre os nomes dos personagens não é mera coincidência. Winnie e Willie são rimas que carregam algo metafórico: uma crítica a casais, que passam a vida se anulando, e que se aprisionam num universo solitário. Aquele tipo de autoajuda farsesca em que dois se tornam um só.
Nesta peça, dirigida por Rita Clemente e coescrita por José Antônio Zille, a trama se assemelha a uma partitura. Nove momentos musicais vão conduzir a história: Fuga, Rapsódia, Rondó, Fantasia, Moteto, Recitativo, Área, Vocalise e Prelúdio.
Elementos que ajudam a destacar os arranjos musicais que unem rock, pop e erudito, sem cair no gosto vulgar ou infame.
Além de uma voz doce, invejosamente afinada, Rita Clemente, que interpreta Winnie, trabalha bem sem perder o tom.
Seu coadjuvante, o marido Willie, traz uma boa performance musical de Márcio Monteiro, que também poderia ser mais bem explorado na atuação.
Infelizmente, os números musicais são curtos, o que talvez tenha ocasionado uma quebra de ritmo. Poesias e canções parecem disputar espaço em tão pouco tempo de espetáculo.
Por outro lado, não se pode deixar de perceber um figurino bem elaborado (também assinado por Rita Clemente). No texto de Beckett, Winnie era enterrada até o pescoço, um dos elementos que iria ajudar a configurar o discutível Teatro do Absurdo.
Já nesta adaptação, Rita Clemente usa um longo vestido que aparenta ter uma cauda interminável, e que se confunde com o palco, dando sinais que Winnie está presa eternamente naquele lar e no seu triste otimismo, de que um dia tudo irá melhorar.
*Átila Moreno é jornalista e escreveu esta crítica a convite do blog.
Dias Felizes
Avaliação: Bom
Quando: Quarta a domingo, 19h30. 55 min. Até 26/05/2013
Onde: CCBB – Centro Cultural Banco do Brasil (Rua Primeiro de Março, 66, Centro, Rio. Tel. 0/xx/21 3808-2020)
Quanto: R$ 6 (inteira) e R$ 3 (meia-entrada)
Classificação etária: 16 anos
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