Racismo estrutural: Buscas pelo termo no Google aumentam mais de 1.400% em três anos

Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo
Racismo estrutural cada vez mais faz parte dos debates sociais. Para se ter uma ideia do impacto do racismo na sociedade, o homem preto recebe hoje no Brasil salário 59% menor que o do homem não preto, e os rendimentos da mulher preta são 46% inferiores aos da mulher não preta, segundo pesquisa do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) do segundo trimestre do ano passado, mostrando que a desigualdade ainda persiste. Levantamento feito pelo Google mostra que as buscas por “racismo estrutural” aumentaram mais de 1.400% em três anos, de 2019 a 2022).
O tema despertou o interesse de um grupo de 15 estudantes da Lumiar Santos com idade de 12 a 14 anos, do 7º ao 9º ano, que criaram um rap para amplificar as discussões sobre o assunto. O “Rap Monumental” aborda o monumento Zumbi dos Palmares da cidade de Santos. A tutora Júlia Lacerda Norato explica que a escola desenvolve projetos pedagógicos a partir do interesse dos próprios estudantes, colocando-os no centro da educação.
Segundo a assitente de Júlia, Vitória Amador, no início do trimestre os alunos demonstraram interesse em assuntos de causas sociais relevantes, especificamente o racismo, levando ao estudo da história da escravidão, suas consequências nos dias atuais e a consicentização do racismo estrutural, para que a sociedade não continue reproduzindo comportamentos que fazem perpetuar a desigualdade. As crianças escolheram falar sobre o monumento a Zumbi dos Palmares de Santos e fazer um rap sobre o tema.
“O rap é conhecido por sua capacidade de transmitir mensagens, contar histórias e dar voz a perspectivas não convencionais. Ao optarem pelo rap como meio de contar a história não oficial de uma personalidade histórica homenageada em um monumento, os estudantes demonstraram interesse em utilizar essa forma de arte para transmitir suas ideias e reflexões”, comenta a tutora.
No processo, as crianças puderam explorar a histórias dos monumentos da cidade e a relação desses monumentos com as narrativas oficiais. Os estudantes participaram ativamente de todo o projeto, desde o debate sobre racismo estrutural até a composição das letras de rap, criação musical e discussões em grupo para aperfeiçoar o projeto. “Foram encontros que proporcionaram a oportunidade do desenvolvimento do pensamento crítico, da escuta ativa, da colaboração e da criatividade dos estudantes”, afirma Vitória.
A atividade permitiu aos estudantes compreender o rap como forma artística de intervenção e apropriação do espaço, aprimorar os conhecimentos sobre cultura popular, práticas literárias e musicais, fornecer uma compreensão histórica sobre monumentos de personalidades e sua função sociopolítica. “Os estudantes expressam suas próprias perspectivas e contam histórias não convencionais, trabalhando reflexão crítica e criatividade. Essas iniciativas favorecem o processo de aprendizagem juntamente a partir de interesses próprios, aquilo que as crianças querem estudar, aprender e descobrir”, diz Julia.
Composição
A composição da letra foi um processo coletivo, que exigiu pesquisa sobre Zumbi dos Palmares. Depois de selecionar informações relevantes para eles, os estudantes se dividiram em grupos e criaram versos com as ideias selecionadas. O grupo contou ainda com a ajuda do rapper Locaut para mostrar um pouco mais sobre o processo de criação, programação de edição e sites com batidas prontas. “Foi um encontro muito importante, agregou muitos novos saberes e foi essencial para o encaixe da letra em uma melodia”, afirma Júlia.
A organização do rap contou com apoio da tutora, da assistente e do mestre de música da escola, Marcelo Marinho. Segundo Júlia, o projeto é uma experiência de aprendizado significativa, que vai além do conteúdo tradicionalmente abordado em sala de aula. A iniciativa representa uma abordagem pedagógica inovadora, envolvendo as crianças de maneira criativa e motivadora. De acordo com a tutora, essa abordagem contribui para o desenvolvimento integral dos alunos e para a construção de um ambiente escolar mais estimulante e participativo.
Júlia comenta que a Escola Lumiar é conhecida por sua abordagem pedagógica inovadora, baseada na autonomia e no protagonismo dos alunos. Com um currículo personalizado, os estudantes têm a liberdade de escolher seus projetos de estudo e são incentivados a aprender por meio da experimentação e da prática. Para os próximos trimestres, os estudantes da escola já definiram temas de interesse como buraco negro, espaço, galáxia, planetas, refugiados, imigração, paisagem, história e a influência da ação humana, música, composição, diferentes estilos de dança, basquete e educação sexual.
Editado por Miguel Arcanjo Prado
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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige Blog do Arcanjo e Prêmio Arcanjo. Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Cultura pela USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por Globo, Record, Folha, Ed. Abril, Huffpost, Band, Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Integra os júris: Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio do Humor, Prêmio Governador do Estado, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Prêmio DID, Prêmio Canal Brasil. Venceu Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio ANCEC, Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade do Prêmio Governador do Estado.
Foto: Rafa Marques
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