★★★★★ Crítica: Marina Sena encerra gloriosa turnê De Primeira e agarra desafio de ampliar sua música e público

Por MIGUEL ARCANJO PRADO
@miguel.arcanjo
★★★★★ Marina Sena, De Primeira Tour
Avaliação: Ótimo
Cantora dona de voz singular e uma autenticidade que não se encontra todo dia por aí, Marina Sena é daquelas joias preciosas e raras na música popular brasileira. E foi, graças a isso e, obviamente, também ao trabalho de um time unido e coeso no propósito de tornar a mineira de Taiobeiras uma estrela do pop nacional, que ela virou fenômeno em um dos tempos mais improváveis, que foi o da pandemia, no qual a cultura passou por algum de seus piores momentos.
De Primeira, o álbum de estreia de Marina Sena na carreira solo, depois de sua passagem inesquecível e impactante pelas bandas A Outra Banda da Lua, de Montes Claros, e Rosa Neon, de Belo Horizonte, conquistou de uma só vez o coração de um público qualificado do presente e do futuro, o que são fichas ganhas para possibilidade de longínqua carreira.

Sob as mãos do hábil e experiente empresário Jorginho Velloso, grande conhecedor dos meandros do mercado musical, e do inventivo produtor e diretor musical Iuri Rio Branco, com quem firmou a louvável parceria na música e na vida que deu origem ao De Primeira, o álbum trouxe a desejada energia do amor e da felicidade. E fez sua artista voar alto feito um balão.
Com impulso da viralização da música Por Supuesto, Marina Sena foi catapultada ao estrelato, aparecendo em programas como o Fantástico, o de Marcos Mion e o de Faustão. Numa daquelas químicas de quem nasce com a estrela, todo mundo ficou apaixonado com a brejeirice e a confiança daquela menina de Taiobeiras, incluindo aqui este crítico. Marina conseguiu feitos, como gravar com o fenômeno contemporâneo Gloria Groove e, o maior de todos, com a icônica Gal Costa, na última gravação da baiana.
Entretanto, é importante frisar, que tudo isso só aconteceu na vida e na carreira de Marina Sena porque ela tinha em mãos um álbum consistente, repleto de verdade, com músicas complexas e letras poéticas que fascinaram o público inteligente, que estava sedento por um pop que unisse a poesia de qualidade à leveza, coisa que ela demonstrou fazer como ninguém em De Primeira.

Voltei pra Mim talvez seja a canção emblemática deste momento, pois demonstra como Marina cresceu ao segurar as rédeas da sua vida e da sua música, seguindo seu instinto. E foi justamente por essa originalidade que um séquito de jovens universitários passaram a venerar sua música por todo o Brasil e também nas principais cidades do mundo.
Marina Sena viu o público cantar cada uma das dez músicas de seu disco De Primeira a plenos pulmões em todos os seus shows. Este crítico esteve no primeiro, onde isso já aconteceu de cara, deixando a cantora assombrada e tremendo da cabeça aos pés. E também viu isso no último, presenciando o mesmo impacto dessas canções nas pessoas, com uma Marina já bem mais à vontade com o sucesso.

Ao longo da movimentada turnê, que durou pouco mais que um ano e que figurou em importantes festivais como Coala e Rock in the Montain, Marina Sena foi ganhando cada vez mais segurança em sua performance no palco, onde a dança, com coreografias criadas por Fernanda Fiuiza — vencedora do Prêmio Arcanjo de Cultura na categoria Dança 2022 justamente por esta criação — foi uma importante aliada para ampliar Marina da tradicional MPB para a abrangência maior do pop. E a coesão da banda rock que a acompanhou na maior parte da turnê, formada por Levy Santiago no baixo, Janluska na guitarra e Iuri Rio Branco na bateria, em uma trinca de química potente e em simbiose com a estrela no palco.
Como toda boa cantora-compositora, Marina Sena utiliza elementos de sua vida em suas canções, e os shows ganharam a atmosfera do que acontecia em seu cotidiano em um ano que, certamente, ela lembrará para o resto de sua vida. A energia de se estar apaixonada e começando um relacionamento com o músico que foi seu parceiro na construção do sucesso era perceptível e deu à turnê De Primeira uma atmosfera única e irrepetível.

Dona de discurso próprio, Marina conversou com o público em cada show, em um lugar de proximidade, descendo o pedestal imagético, ora trocando ideia com algum conterrâneo que aparecia na plateia, ora lembrando causos de sua Taiobeiras natal ou da Montes Claros que lhe abriu as portas da música, ou suas impressões acerca da metrópole chamada São Paulo, com seu vertiginoso ritmo de concreto que lhe impacta de forma profunda em todos os sentidos, inclusive na sua música do futuro.
Agora, Marina Sena segue para o maior desafio que sua carreira lhe coloca até este momento: lançar o segundo álbum e transformá-lo em sucesso após um De Primeira arrebatador. Porque parte de uma alta expectativa.

A prévia, com Tudo pra Amar Você, canção lançada depois do Carnaval, apontou para uma proposta mais chiclete e simplória musicalmente do que a Marina à qual estávamos acostumados, inclusive no discurso. Em vez da Marina decidida dos versos “se for pra ser melhor, pra ser ruim, nem quero”, de Voltei pra Mim, a Marina de Tudo pra Amar Você encerra a canção em tom melancólico: “Você não me disse que é ilusão, logo eu que te dei meu coração. Tudo que eu te peço só levo não, só levo não”.
Tudo bem um artista navegar por diferentes matizes, sentimentos e sonoridades, sobretudo alguém que quer atingir cada vez um público mais amplo. Afinal, quem fica parado é poste e ninguém merece ficar aprisionado em uma só caixinha.
Contudo, é falto que há uma expectativa elevada em relação a este álbum a ser lançado em breve, dessa vez pela gravadora Sony, com quem a cantora assinou contrato.

A fama tem suas delícias e também suas dores, e Marina parece saber disso muito bem, profissional do ramo que é. Ela não começou ontem e já viveu muita coisa para seus 26 anos de vida. E viverá outras tantas.
A liberdade roqueira e a ousadia extrema dos tempos de A Outra Banda da Lua ou o pop ainda ingênuo do Rosa Neon ficaram para trás. E ela sabe disso. Agora, Marina entra em terra de cachorros grandes, contratada de uma gravadora multinacional, e está ávida por fazer sua música comunicar com ainda mais pessoas. Para isso, ela precisa se empoderar ainda mais e ter muita certeza da força do que ela é em sua essência, que foi o que lhe tornou notória, mas sem que isso seja uma redoma.

Neste avanço a novos caminhos e na resolução desta complicada equação, Marina precisa ser absolutamente estratégica e cuidadosa para também não deixar de lado seu público-base, aqueles jovens inteligentes espalhados por todo o Brasil e por rincões desconhecidos do mundo que ficaram assombrados com sua originalidade e pela complexidade engenhosa (e barroca mineira, por que não?) de sua música inigualável.
Certamente, a artista conseguirá solucionar esta equação. É o que todos esperamos.
Que venha a nova fase de Marina Sena.
★★★★★ Marina Sena, De Primeira Tour
Avaliação: Ótimo
Crítica por Miguel Arcanjo Prado
Colaboraram David Godoi, Angelina Colicchio, Juan Manuel Tellategui e Jorginho Velloso.


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Editado por Miguel Arcanjo Prado
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Jornalista cultural influente, Miguel Arcanjo Prado dirige o Blog do Arcanjo desde 2012 e o Prêmio Arcanjo desde 2019. É Mestre em Artes pela UNESP, Pós-graduado em Mídia e Cultura pela ECA-USP, Bacharel em Comunicação pela UFMG e Crítico da APCA – Associação Paulista de Críticos de Artes, da qual foi vice-presidente. Eleito três vezes um dos melhores jornalistas culturais do Brasil pelo Prêmio Comunique-se. Passou por TV Globo, Grupo Record, Grupo Folha, Editora Abril, Huffpost Brasil, Grupo Bandeirantes, TV Gazeta, UOL, Rede TV!, Rede Brasil, TV UFMG e O Pasquim 21. Foi coordenador da SP Escola de Teatro. Integra o júri do Prêmio Arcanjo, Prêmio Jabuti, Prêmio Governador do Estado de SP, Sesc Melhores Filmes, Prêmio Bibi Ferreira, Destaque Imprensa Digital, Prêmio Guia da Folha e Prêmio Canal Brasil. Vencedor do Troféu Nelson Rodrigues, Prêmio Destaque em Comunicação ANCEC, Troféu Inspiração do Amanhã, Prêmio África Brasil, Prêmio Leda Maria Martins e Medalha Mário de Andrade Prêmio Governador do Estado, maior honraria na área de Letras de São Paulo.
Foto: Edson Lopes Jr.
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