Opinião: Berço do Brasil moderno, Pampulha vira Patrimônio da Humanidade
Por Miguel Arcanjo Prado
Foi em volta de uma lagoa belo-horizontina que surgiram as curvas de um Brasil moderno. Os mineiros, como eu, que na infância gostava de desenhar a Igrejinha da Pampulha, sabem disso muito bem. Por isso, amanheceram neste domingo (17) em festa. Afinal, viram Minas Gerais ganhar o quarto título de Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco, desta vez concedido ao Conjunto Moderno da Pampulha. O orgulho é grande.
Contudo, por pouco a festa não foi prejudicada pela tentativa horrenda de golpe militar na Turquia, onde acontece em Istambul a 40ª Sessão do Comitê do Patrimônio Mundial da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura). A reunião, que ocorreria na sexta (15), teve de ser adiada por conta da instabilidade naquele país, mas, retomado o poder civil, prosseguiu neste domingo (17), chegando ao resultado tão importante para o Brasil.
Quem confirmou a informação foi o presidente da Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte, Leônidas Oliveira, nos últimos meses embutido em campanha obsessiva para ver o precioso conjunto arquitetônico moderno mineiro da Pampulha ganhar notoriedade mundial. Sente-se um esportista com medalha de ouro no peito.
“Foram anos de trabalho, como um atleta para uma Olimpíada: treinamos, treinamos, treinamos e depois ganhamos”, definiu Oliveira, lembrando que a candidatura foi feita em parceria da Prefeitura de Belo Horizonte com o Iepha (Instituto Estadual do Patrimônio Histório e Artístico de Minas Gerais) e o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). Ele ainda avisou que, por conta do novo título, um ônibus turístico passará a circular pela orla.
A sociedade agora espera que o título faça com que o poder público cuide das águas da Pampulha, poluídas por décadas, bem como proteja também a região da especulação imobiliária que sonha em verticalizar o belíssimo bairro belo-horizontino.
O impacto das curvas de Niemeyer na Pampulha foram gigantescos para a arquitetura e o pensamento moderno no Brasil e no mundo. E é impactante que elas tenham surgido justamente na Minas Gerais repleta de cidades históricas com seus exuberante barroco colonial. A lagoa artificial de uma jovem capital planejada, a Pampulha foi o anúncio de um novo Brasil sonhado, moderno e arrojado. E é interessante que tal conjunto tenha sido construído justamente na gestão de Juscelino Kubitschek como prefeito de BH, nos anos 1940, logo ele que veio da histórica Diamantina.
Pampulha passa a ser o quarto título de Patrimônio Cultural da Humanidade no Estado de Minas Gerais, ao lado dos centros históricos de Ouro Preto e de Diamantina, além do Santuário de Bom Jesus de Matosinhos, com os profetas esculpidos por Aleijadinho, em Congonhas. O quarteto tem o mesmo título dado a patrimônios internacionais como as Pirâmides do Egito, o Palácio Taj Mahal, na Índia, e as Muralhas da China.
A represa que originou a Pampulha começou a ser feita em 1936, ainda na gestão do então prefeito de BH Otacílio Negrão de Lima, que hoje dá nome à avenida que a circunda. As obras só tiveram fim em 1943, quando Juscelino Kubitschek já era o prefeito da capital mineira e teve a ideia de convidar o então jovem arquiteto e amigo Oscar Niemeyer para criar um robusto conjunto arquitetônico em volta das águas, no qual se destacam a Igreja de São Francisco de Assis, chamada carinhosamente de Igrejinha da Pampulha, o antigo Cassino, hoje Museu de Arte da Pampulha, e a Casa do Baile.
Assim, foi na Pampulha que se forjou a dupla de sucesso entre o político JK e o arquiteto Niemeyer, que a partir da obra em volta da lagoa mostrou suas curvas ao mundo, ganhando notoriedade fora de nossas fronteiras. Os dois repetiriam a dupla de sucesso na criação de Brasília, inaugurada em 1960 e que tornou-se o primeiro conjunto arquitetônico moderno a receber o título de Patrimônio Cultural da Humanidade, em 1987.
Desta forma, Pampulha, espécie de mãe do Brasil moderno, recebe seu título de Patrimônio Cultural da Humanidade atrasada. Mas, enfim, o conquistou. E é preciso comemorar. Agora, a Pampulha está credenciada a tornar-se, ainda mais, orgulho dos belo-horizontinos, dos mineiros, dos brasileiros e, claro, do mundo inteiro.
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