Com Antonio Fagundes e filho, Vermelho tem discurso que leva espectador à reflexão

Bruno e Antonio Fagundes em cena: embate entre duas gerações - Foto: João Caldas

Por Miguel Arcanjo Prado

Apesar de se passar na Nova York em fins da década de 1950, a peça Vermelho, escrita por John Logan e dirigida por Jorge Takla, dialoga com o Brasil de hoje.

A montagem apresenta um panorama de um artista consagrado, o pintor russo radicado nos EUA Mark Rothko (1903-1970), interpretado por Antonio Fagundes. Este está em crise com os novos tempos, dominados por gente de formação e valores diferentes dos dele, geração representada pelo jovem pintor Ken, papel de Bruno Fagundes, filho do ator.

Tal qual na emergente Nova York do pós-guerra, o dinheiro que chega ao Brasil atual muitas vezes não vem associado a uma maior preocupação intelectual. Os velhos livros são substituídos pelas velozes (e quase sempre) superficiais formas de comunicação.

O vermelho que titula a obra envolve o público assim que este entra no Teatro GEO. As cadeiras são vermelhas, assim como o piso e os elementos da cenografia pomposa e realista criada por Takla, que reproduz o ateliê de Rothko e suas obras. A cor pode ter vários significados, dependendo da intenção do olhar de quem vê.

A obra é calcada no embate de ideias entre o arrogante Rothko, que sofre ao saber que já representa o pensamento ultrapassado, e o novato Ken, que, apesar de reverenciar o mestre, acaba por desprezar a prepotência dele, despertando-lhe um desejo de matar o velho e criar o novo. Tal qual o movimento da vida.

O belo e poético texto é o destaque do espetáculo. Cada palavra pronunciada leva o espectador à reflexão da arte e de seu papel nos tempos atuais. Apesar de excessiva preocupação com a forma, como no cenário detalhista, a direção de Takla acentua o trabalho dos atores.

Com domínio de cena, Antonio Fagundes constrói um personagem a partir do ressentimento, da prepotência e da desesperança. Apesar de ser perceptível o esforço do ator na composição do personagem, a direção talvez pudesse ter incentivado o artista a buscar um pouco mais de dualidade na construção do mesmo, porque o homem não é apenas um lado, como o próprio texto da peça diz.

A atuação de Bruno Fagundes é a própria representação da inocência que seu personagem simboliza. O jovem ator assumiu uma tarefa difícil, contracenar com um homem íntimo do palco, que além de ator consagrado é seu pai. Mas Bruno demonstra coragem e humildade neste embate, sabedor de que ainda tem extenso caminho a trilhar.

Apesar da proposta naturalista no cenário, iluminação e atuações, a direção mexe com a convenção em alguns momentos, como quando coreografa os dois atores na pintura da tela em vermelho ou sugere um caminhar típico de teatro musical (gênero em que o diretor da peça é referência) ao personagem de Bruno, que não combina com a proposta da encenação.

Entretanto, o grande mérito da obra está em seu conteúdo. É o discurso apaixonado de Rothko que mexe com o espectador. Fala de um artista tão envolvido pela verdade de sua arte a ponto de recusar milhares de dólares para transformar sua obra em um produto comercial. Tal hombridade, tão incomum, impacta e leva à reflexão dos valores vigentes na atualidade.

Leia o perfil de Bruno Fagundes

Vermelho
Avaliação: Bom
Quando: quinta e sábado, às 21h; sexta, às 21h30; e domingo, às 18h. Até 29/7/2012
Onde: Teatro GEO – Instituto Tomie Ohtake (r. Coropés, 88, Pinheiros, Metrô Faria Lima, São Paulo, tel.0/xx/11 3728-4930)
Quanto: R$ 100 a R$ 120
Classificação: 12 anos

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