Carnaval de BH espera 5 milhões de pessoas e diz que é de todo mundo
Enviado especial a Belo Horizonte (MG)* – Belo Horizonte espera o maior Carnaval de sua história com 5 milhões de pessoas nos mais de 500 blocos de rua, desfile das escolas de samba e dos blocos caricatos e palcos espalhados pelas nove regionais, tudo com programação gratuita nos próximos dias. O lema este ano é: “O Carnaval de Belo Horizonte é de todo mundo!” e o foco é combater qualquer tipo de preconceito na festa, conscientizando os foliões a respeitarem as diferenças. Para que a festa seja bonita, a capital mineira, chamada de cidade criativa, se prepara para receber bem os turistas — os mineiros têm fama de serem exímios anfitriões —, vindos não só do interior mineiro como de toda parte do país, já que a fama do redescoberto Carnaval de BH corre todo o Brasil com seus blocos para todos os gostos.
Blocos para todos os gostos
Para ficar só em alguns exemplos da diversidade da festa, há desde o bloco indiano-baiano-mineiro Pena de Pavão de Krishna, na manhã de domingo de Carnaval com seus foliões da paz e do amor pintados de azul, como também a força afro avassaladora do Angola Janga com suas 100 mil pessoas negras em festa no centro na tarde do mesmo dia. No pré-Carnaval, já foram destaque as feministas do Sagrada Profana e o bloco Como Te Lhama?, com imigrantes latino-americanos, como a cantora chilena Claudia Manzo, fazendo a reconexão com nossa tão esquecida latinidade.
Ainda se destacam na festa o excesso de purpurina do Então, Brilha!, que carrega uma multidão no amanhecer do sábado de Carnaval no centro; o Volta Belchior, que celebra na tarde do mesmo dia no boêmio bairro de Santa Tereza o músico cearense; a Corte Devassa, com seus artistas vestidos de época e com presença de nomes como Lira Ribas e Marcelo Veronez; e o Unidos da Estrela da Morte, que encanta os nerds com seus foliões vestidos de personagens da saga cinematográfica “Guerra nas Estrelas”.
Conheça a programação completa do Carnaval de BH
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Números gigantes
As três últimas edições do Carnaval de BH foram gigantes: 3 milhões de foliões em 2017, 3,8 milhões em 2018 e 4,3 milhões em 2019, quando a festa chegou a 23 dias. Gerida pela Belotur, órgão público municipal promotor do turismo na cidade, a folia belo-horizontina engloba 40 instituições municipais, estaduais, federais e privadas que se unem para que tudo dê certo. O montante da festa é de R$ 6 milhões em verba direta, mais R$ 8,3 milhões em planilhas de estruturas e serviços.
Folia politizada
Um forte Carnaval de rua é algo relativamente novo na capital mineira. Ele é fruto, sobretudo, de um movimento surgido espontaneamente nas ruas de Belo Horizonte e no começo sem qualquer tipo de ajuda do poder público. A folia renasceu em grande parte por conta da garra de jovens universitários e antigos moradores dos bairros, que resolveram retomar a festa.
Esta turma resolveu movimentar BH, antes cidade-dormitório nesta época do ano, criando blocos que na última década se espalharam pelos quatro cantos da cidade. Mas, os foliões pioneiros não se esquecem que, no começo, a folia foi duramente reprimida pelo então prefeito Márcio Lacerda — que chegou a proibir festas em espaços públicos da capital mineira. Mas isso só tornou a folia mais forte ainda. E altamente politizada desde então.
Por isso, em BH, o Carnaval de Rua é visto pelos seus frequentadores como “um ato político” — majoritariamente, à esquerda —, com foliões que defendem veementemente a ocupação das ruas em festa com seus corpos diversos e libertos.
Pioneiros na folia
Mas, o Carnaval de Belo Horizonte não é novidade de dez anos para cá. Apesar de vivermos no Brasil sem memória, não custa lembrar que ele existe desde 1897, quando os operários que construíram a primeira capital planejada do Brasil resolveram fazer um desfile de carros e carroças que partiu da Praça da Liberdade até a Avenida Afonso Pena — até hoje local de desfile de escolas de samba e blocos caricatos, que neste ano será na segunda (24) e terça (25), sempre a partir das 18h.
Outro bloco tradicional da folia mineira e que resistiu mesmo nos anos mais parados é a Banda Mole, fundada em 1975 e que celebrou seus 45 anos no último sábado (15), lotando a Afonso Pena. Mas o primeiro bloco foi o Leão da Lagoinha, no bairro de mesmo nome, surgido em 1947 e existente até hoje — ele abrirá o desfile dos Blocos Caricatos. Já a primeira escola de samba foi a Agremiação Pedreira Unida, com moradores da vizinha Pedreira Prado Lopes, uma das maiores comunidades de BH.
Nos anos 1970, os blocos ganharam mais força e os desfiles de escolas de samba viveram seu auge na década de 1980, quando surgiu também o primeiro bloco afro da cidade, o Afoxé Ilê Odara, fundado pela ialorixá Dona Oneida Maria da Silva Oliveira, a Mãe Gigi, no bairro Aparecida. Em seu primeiro desfile, o bloco entoou: “Vem meu povo, olha quem chegou, Afoxé Ilê Odara, o primeiro de Belô”. Hoje, seguindo essa tradição, quem abre o desfile das escolas de samba na terça (25) é o Afoxé Bandarerê.
Respeitando a ancestralidade afro da capital mineira, o Carnaval de BH é aberto nos últimos anos com o Kandandu, famoso encontro de blocos afro de Belo Horizonte, que neste ano vai homenagear os 20 anos do Bloco Oficina Tambolelê. Serão duas apresentações: na sexta-feira, dia 21, a partir de 18h, e no sábado, dia 22, a partir de 16h, na Praça da Estação.
É fato que após a efervescência dos anos 1980, a festa de Momo perdeu muito de sua força, vivendo seu maior ocaso no começo dos anos 2000. A partir de 2008 é que a folia passou a ser redescoberta pelos belo-horizontinos, ganhando força ano após ano. Até então, a única saída era rumar para as cidades históricas do interior de Minas em busca de agito. Não custa lembrar que até hoje o Carnaval faz a fama de cidades barrocas como Ouro Preto, Mariana, Tiradentes, Sabará e Diamantina, que permanecem agitadíssimas nesta época do ano.
Pelo jeito, quando o assunto é Carnaval, o mineiro não quer mais saber de comer quieto. Muito pelo contrário, deseja mesmo é botar a boca no trombone.
*O jornalista, colunista do UOL e crítico Miguel Arcanjo Prado viajou a Belo Horizonte a convite da Belotur.
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