Crítica: Thiago Mendonça cria catarse potente em Stonewall 50

Catarse cênica de um ótimo ator: Thiago Mendonça está no solo “Stonewall 50 – Uma Celebração Teatral” – Foto: Henrique Resende – Divulgação – Blog do Arcanjo – UOL

Thiago Mendonça é um dos atores mais talentosos de sua geração. Tanto que, quando é presenteado com bons personagens na TV, costuma roubar a cena, como fez com o carnavalesco Bernardinho de “Duas Caras”, de Aguinaldo Silva, em 2007, ou o médico alcoólico Felipe, de “Em Família”, de Manoel Carlos, em 2014. No cinema, não é diferente, caso de seu intenso jovem de classe média viciado em drogas de “Tropa de Elite”, em 2007, ou da personificação do lendário astro do rock nacional Renato Russo na cinebiografia “Somos Tão Jovens”, de 2013.

Tal talento cênico agora pode ser conferido de perto nos palcos de São Paulo, onde o carioca está radicado há cinco anos, no espetáculo “Stonewall 50 – Uma Celebração Teatral”. Trata-se do primeiro solo do ator, em versão intimista apresentada no Espaço do Satyros Um na praça Roosevelt, sempre às 23h59 de sextas e sábados até o fim de julho. A montagem dirigida por Renato Farias marca a primeira produção paulistana da Cia. Teatro Íntimo, do Rio, da qual Mendonça faz parte há 15 anos.

No espetáculo com dramaturgia em conjunto do ator com o diretor, Mendonça usa como inspiração os 50 anos da rebelião no bar Stonewall Inn, em Nova York, em 28 de junho de 1969. Foi quando a comunidade LGBT+ resolveu reagir à altura diante da violência policial e das duras leis que perseguiam essa frágil parcela da população. O levante disparou a luta pelos direitos dessa dita minoria em todo o mundo, minoria esta ainda vítima de forte perseguição e violência no Brasil atual.

A partir da premissa de celebrar o cinquentenário de Stonewall e inspirado também pelo disco “Stonewall Celebration Concert”, de Renato Russo, em 1994 — quando o roqueiro comemorou os 25 anos do chamado “levante gay” —, Mendonça faz, na realidade, um depoimento emocionado e catártico sobre a relação com sua própria sexualidade. Assim, o artista transforma seu particular em algo universal, sensibilizando a plateia, com a fiel companhia dos bonecos e bonecas de sua coleção particular, a começar de Judy Garland — atriz de “O Mágico de Oz” e ícone gay cujo funeral ocorreu no meso dia da batalha de Stonewall, onde estavam muitos gays que “bebiam” em sua memória.

De forma corajosa, sobretudo para uma figura pública, Mendonça fala abertamente de sua sexualidade e faz bem ao condenar o preconceito, sobretudo o que pesa sobre os atores, sempre patrulhados por uma mídia heteronormativa e homofóbica, chegando a lamentar em cena que o fato de um ator ser publicamente homossexual ainda hoje lhe cause prejuízos na carreira, lembrando da recusa da escalação de seu nome para determinados papéis na televisão. A força dessa fala só prova que a ignorância social também se repete em um ambiente dito artístico de forma vergonhosa.

O grande chamariz da montagem se concentra realmente no talento de Thiago Mendonça, ator visceral que se entrega ao espetáculo em um mergulho profundo. A direção, enquanto soluções cênicas e também dramatúrgicas, poderia ter sido mais propositiva, sobretudo quanto à estética, buscando uma aura maior de poética cênica que resguardasse ainda mais o artista ali tão entregue. Mas, Mendonça é tão sólido em cena que o público mergulha em sua verdade, deixando todo o entorno infinitamente pequeno diante da catarse artística deste grande ator em cena. Ator este que merece ser aplaudido de pé por todos nós pela enorme coragem e pelo vigor que imprime ao teatro que faz repleto de verdade.

“Stonewall 50 – Uma Celebração Teatral”
Crítica por Miguel Arcanjo Prado

Avaliação: Muito Bom ✪✪✪✪
Quando: Sextas e Sábados, 23h30. 50 min. De 28/6 a 27/7/2019
Onde: Espaço dos Satyros Um (praça Franklin Roosevelt, 214, Consolação, metrô República ou Higienópolis-Mackenzie, São Paulo, tel. 11 3258-6345).
Quanto: R$40 inteira e R$ 20 meia.
Classificação: 16 anos

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Thiago Mendonça faz grande performance em “Stonewall 50 – Uma Celebração Teatral” – Foto: Henrique Resende – Divulgação – Blog do @miguel.arcanjo – UOL

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