Crítica: Musical A Pequena Sereia enche os olhos, mas falta vigor cênico

Os atores Fabi Bang (Ariel) e Rodrigo Negrini (Príncipe Eric) em uma das cenas mais bonitas do musical A Pequena Sereia, que faz últimas sessões no Teatro Santander, em SP – Foto: João Caldas – Divulgação – Blog do Arcanjo – UOL

Crítica por Miguel Arcanjo Prado
“A Pequena Sereia” ✪✪✪
Avaliação: Bom

Lançada em 1989, a animação “A Pequena Sereia” causou frisson entre as crianças na virada dos anos 1980 para 1990, com a história de Ariel, a sereia insatisfeita com o fundo do mar que sonha em trocar sua cauda por pés para viver o amor por um príncipe humano.

A fita VHS da Disney que figurou nos anos 1990 como uma das mais disputadas nas seções infantis das antigas videolocadoras ganhou em 2008 versão para a Broadway, agora no Brasil, dez anos depois.

Após o sucesso arrasa-quarteirão em “Wicked”, no qual demonstrou talento farto como a bruxa Glinda, a atriz Fabi Bang defende a personagem-título.

A atriz canta de modo doce e impecável, mas dispõe de recursos cênicos já conhecidos bem mais potentes do que apresenta em sua Ariel: apesar de correta e verossímil, falta real jogo teatral.

E o que parece faltar para que a atriz realmente se sobressaia são colegas com os quais possa estabelecer um potente jogo cênico que impulsione a todos.

Tiago Abravanel interpreta o caranguejo Sebastião em A Pequena Sereia – Foto: João Caldas – Divulgação – Blog do Arcanjo – UOL

Nesta montagem de “A Pequena Sereia”, a técnica parece se sobressair à construção da magia, tão fundamental em um musical deste estilo.

A falta de percepção do tempo cênico por boa parte dos artistas, sobretudo nos diálogos, é o maior entrave. Se o elenco faz com desenvoltura os números de dança e, sobretudo, as cenas mais técnicas, como aquela sublime em que Ariel salva o Príncipe de se afogar no mar, fata verdade quando surgem as palavras.

Na maior parte, o texto é dito de forma monocórdica ou atravessada — como nas cenas do Rei Tritão (Conrado Helt) ou das irmãs sereias de Ariel. Tudo parece ser obrigado a fluir em um ritmo tão alucinante que não há tempo para a construção de estados cênicos que tragam verdade ao que é dito.

Andrezza Massei(ao centro) se destaca por uma atuação segura e irônica como Úrsula em A Pequena Sereia – Foto: João Caldas – Divulgação – Blog do Arcanjo – UOL

Se a Ariel de Fabi Bang, mesmo navegando em águas turvas, ainda guarda certo frescor, o mesmo se pode dizer também de outro destaque: Andrezza Massei.

A atriz que brilhou recentemente em “Les Miserables” defende sua Úrsula com todos os tentáculos possíveis e confere fina ironia e humanidade à vilã fartamente inspirada na figura de uma drag, arrebatando o público.

Andrezza demonstra entendimento da propositiva versão brasileira feita por Mariana Elisabetsky e Victor Mühlethaler, realmente um trabalho dramatúrgico digno de aplauso e repleto de nuances muitas vezes não compreendida por quem o diz.

Fabi Bang e Tiago Abravanel no musical A Pequena Sereia – Foto: João Caldas – Divulgação – Blog do Arcanjo – UOL

Tiago Abravanel, outro ator que já demonstrou talento ao construir real presença cênica com seu inesquecível e consagrador Tim Maia, dessa vez faz um Sebastião mecanizado, apesar da tentativa de impulsionamento carismático com a construção de um sotaque nordestino caricato. Apenas em alguns instantes, poucos, Abravanel consegue se soltar da forma e realmente se divertir em cena, fazendo com que o público se delicie.

É preciso ressaltar o grandioso trabalho de corpo desenvolvido pela direção e coreografia de Lynne Kurdziel e Fernanda Chamma, que conseguiram impor uma movimentação aos artistas que transforma o palco em um inebriante e gigantesco aquário, associado ao barroco e multicolorido cenário e à luz precisa de Benjamin la Cour — há cenas de beleza estética realmente impressionante.

Cena da música No Nosso Mar, uma das mais bem resolvidas do musical A Pequena Sereia – Foto: João Caldas – Divulgação – Blog do Arcanjo – UOL

Também é fato que a cena da canção “No Nosso Mar” é uma das mais bonitas e bem resolvidas, com todo o elenco realmente presente — no coro, Letícia Soares se destaca pela grande voz, infelizmente pouco aproveitada nos arranjos, e Carla Vazquez é outro alento, pela presença intensa mesmo quando os holofotes não estão nela.

Os arroubos de luz e cenário e a cuidadosa direção musical de Vânia Pajares faz encher olhos e ouvidos do público que assiste ao musical “A Pequena Sereia”, mas, aos que possuem um olhar mais afinado, fica uma sensação de que faltou vigor cênico àqueles seres do fundo do mar ou, até mesmo, da superfície.

Crítica por Miguel Arcanjo Prado
“A Pequena Sereia” ✪✪✪
Avaliação: Bom
Quando: Quintas às 16h e 20h, Sextas, às 21h, Sábados, às 16h e 20h, Domingos, às 15h e 19h. Até 29/7/2018
Onde: Teatro Santander (Complexo do Shopping JK – Av. Juscelino Kubitschek, 2041 – Itaim Bibi – SP)
Quanto: R$ 75 a R$ 280 (valores de inteira)

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