Crítica: Nena Inoue sintetiza ideologia da velha esquerda e brilha no Festival de Curitiba

Nena Inoue se destaca no Festival de Curitiba com “Para Não Morrer” – Foto: Samira Chami Neves/Clix

Por Miguel Arcanjo Prado
Enviado especial a Curitiba*
Foto Samira Chami Neves/Clix

Em 1988, um ano  antes da queda do Muro de Berlim, Cazuza cantou: “Os meus sonhos foram todos vendidos, tão barato, que eu nem acredito… Ideologia, eu quero uma pra viver”.

Os versos são sintomáticos de uma geração que viu suas utopias desmoronarem junto com aquele muro. Contudo, ainda perdida, parte dela buscou resistir e (re)existir, se reinventar, mesmo sem saber como. “Para Não Morrer”, como é o título da peça defendida pela respeitada atriz paranaense Nena Inoue na 2ª Curitiba Mostra do Festival de Curitiba, no Teatro José Maria Santos.

O texto do jovem dramaturgo Francisco Mallmann bebe da fonte farta do uruguaio Eduardo Galeano, espécie de Bíblia da velha esquerda latino-americana.

Assim, Nena surge no monólogo em uma construção de uma velha senhora que rememora os grandes feitos de resistência contra a opressão capitalista no passado. Aos poucos, ela vai conquistando a plateia para a convenção imposta, mergulhando todos naquele mar de histórias de homens e, sobretudo, mulheres fortes, latino-americanos.

Com parceria de Babaya na criação do espetáculo, Nena sintetiza a ideologia da velha esquerda e faz dialogar o passado com o presente, apresentando semelhanças entre os tempos confusos vividos com o que já ocorreu na América Latina e teima em se repetir como farsa. Quando fala dos tempos da ditadura, a atriz ganha força ainda maior.

O discurso de Nena Inoue nesta peça é forte, ainda mais porque a atriz mantém viva em si mesma a utopia de encontros e lutas — ela é uma das produtoras da Curitiba Mostra, que chega à segunda edição, desta vez dentro da Mostra Oficial do Festival de Curitiba, dando espaço e voz também para os artistas da cidade que abriga o maior festival teatral do Brasil.

Nena Inoue não foge à luta. Muito pelo contrário, a enfrenta de cabeça erguida. Mais que uma grande atriz, é uma artista de verdade, daquelas que ainda não permitiram que seus sonhos fossem todos vendidos.

“Para Não Morrer” * * * *
Avaliação: Muito bom

*O jornalista Miguel Arcanjo Prado viajou a convite do Festival de Curitiba. 

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