Crítica: Monga desconstrói ideia de beleza pelo olhar do outro e mostra quão interessante somos

Maria Carolina Dressler: Monga é fruto de árdua pesquisa da atriz no Brasil e na Itália – Foto: Adriana Balsanelli

Por Miguel Arcanjo Prado

O mundo cada vez mais diverso vive a dicotomia de ser cada vez mais careta e restritivo. Assim, vemos tristes histórias nas quais o que é diferente é excluído ou vira atração para chacota pública. Uma verdadeira involução humana.

Quem vê a atriz Maria Carolina Dressler no monólogo Monga, dirigido por Juliana Sanches, passa por tais reflexões enquanto acompanha o sofrimento daquela mulher aprisionada naquela jaula – um cenário potente criado por Paula de Paoli inspirada nas gaiolas da artista plástica Louise Bourgeois (1911-2010).

E referências intelectuais dão a obra um tom pungente, onde a pesquisa é evidente. O espetáculo é resultado de trabalho investigativo de Dressler sobre o assunto, seja no Brasil como também fora dele, já que ela esteve na Itália na fase de gestação da peça.

O interesse inicial veio do número da Monga, a mulher que vira macaco, conhecido em todo o mundo e que habitava as memórias de infância da atriz. Daí, partiu para a pesquisa sobre a vida da mexicana Julia Pastrana (1834-1860), que tinha o corpo coberto por pelos e foi transformada em atração bizarra pelo próprio marido. Somando-se a isso, entre outras coisas, veio a investigação do trabalho do cineasta italiano Marco Ferreri, que abordou a temática em seus filmes.

Seja em projeção na tela que faz teatro se misturar ao cinema, no discurso fragmentado da personagem ou nas imagens poéticas que o corpo de Dressler cria no ambiente cênico, tais referências se fazem presentes e convidam o público a entrar na história.

A obra contou com supervisão do diretor italiano Pietro Floridia, do Teatro Dell’Argine, de Bologna e que dirigiu Dressler e Sanches na recente peça Estrada do Sul, do Grupo XIX de Teatro, em São Paulo. A peça foi apresentada neste dezembro, no Sesc Santo André, em São Paulo, e fará turnê pelo Estado em 2014. Em 1º de fevereiro, fará duas apresentações no Sesc Araraquara. No dia 14 de março, faz apresentação única no Sesc Ribeirão Preto.

Apesar de a parte documental ser o ponto de partida da encenação, o que toca o espectador nesta obra é a “mulher interessante” que Dressler cria.

O discurso leva a plateia a aceitar o outro ali presente de forma desconcertante no corpo da artista. Dressler assume a feiura daquela personagem e a desconstrói. Até porque esta feiura só existe no olhar do outro, não no olhar da personagem sobre si mesma.

Assim, a beleza da atriz convive de forma contraditória com a imagem repulsiva daquela mulher-macaco presente no discurso do outro não assimilado por esta.

E é aí que mora o maior mérito do espetáculo. Dizer que o feio pode ser belo. E que, mesmo que os outros façam afirmações preconceituosas e apressadas, é preciso acreditar no quão interessante podemos ser. Basta que quebremos o espelho do outro e acreditemos um pouco mais em nós mesmos.

Monga
Avaliação: Muito bom

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1 Resultado

  1. Felipe disse:

    Sensacional o discurso! Ponto para Dressler.

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