Flávio Venturini faz show com essência mineira

Tímido, Venturini se concentrou em sua música e não quis muito papo - Divulgação

Por Miguel Arcanjo Prado

Só um mineiro sabe a sensação que é ver o mar pela primeira vez. Flávio Venturini, grande compositor que é, foi talvez o que melhor conseguiu eternizar essa impressão em forma de poesia musical, com Todo Azul do Mar.

Resolvi ver o show dele na noite desta quinta (8), no auditório Simón Bolívar do Memorial da América Latina, em São Paulo, dentro do Projeto Adoniran, que leva grandes nomes da MPB ao encontro do público paulistano a preços populares.

Venturini, que fez história na música com 25 discos já produzidos, surgiu tímido em seu piano elétrico, acompanhado de outros três músicos, no baixo, na guitarra e na bateria. Abriu com Máquina do Tempo, aquela canção nostálgica que diz “ah, seria bom se o tempo voltasse”.

E era clara na plateia a presença dessa nostalgia. Mas Venturini quebrou com a expectativa de quem queria reviver velhos e bons tempos em seu show, e focou o repertório em canções recentes, deixando apenas alguns velhos hits para o finzinho de tudo.

Mesmo diante de faniquitos de fãs mais empolgados – alguns até declararam amor -, ele manteve uma fria compostura e preferiu não dialogor. Reservado, limitou-se a cantar o repertório bem longe dos tempos em que ele era vocalista do 14 Bis. 

De pegada pop, com influência clara do rock e da especificidade da música do Clube da Esquina, coisa que só o clima de conjunção de roça e metrópole de Belo Horizonte foi capaz de produzir, a música de Venturini fala de sentimentos fortes, mas simples. Ele tem uma poesia própria e um ritmado musical exclusivo, que envolve o público, mesmo diante da timidez do intérprete.

A voz de Venturini, de extensão impressionante, continua bem na fita, quando comparada à de colegas como Lô Borges, que já não cantam como antes. É claro que é uma voz cujo tempo se faz perceptível, mas ainda é límpida, clara e, sobretudo, afinada, mesmo nas notas mais difíceis.

O setentão Milton Nascimento, grande incentivador de seus parceiros mineiros, foi homenageado na noite, no bis. Depois de Todo Azul do Mar, a canção mais aguardada, Venturini fez emocionada interpretação de Travessia, canção que lançou Bituca ao mundo.

O cantor soltou a voz na estrada, acompanhado pelo coro formado pela plateia, inerte e feliz diante da força que a canção tem.

Na condição de um mineiro fora de sua terra há cinco anos, perdido nessas terras paulistanas, ver o show de Venturini foi como ver de perto Minas, o velho retrato na parede. Ai, como dói, como diria nosso maior poeta, Carlos Drummond de Andrade.

Lembrei-me do grande artista João Júnior Fernandes, cantando comigo Todo Azul do Mar, no auditório da Reitoria da Universidade Federal de Minas Gerais para os jovens calouros… Bons tempos.

Já sendo bairrista, chego à conclusão de que tem coisas que só mineiro entende, como a sensação de ver o mar pela primeira vez. E o show de Venturini, belo-horizontino como eu, faz parte dessa coleção de mistérios das alterosas.

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